1946
Meyer Filho atribuía a um “estalo de Vieira” o fato de ter se tornado, ou melhor, se descoberto artista, quando já era funcionário do Banco do Brasil. Ele explicou o evento em algumas ocasiões, como na crônica “Cícero de Almeida, meu colega de banco e companheiro de boêmia, sua estranha e, para mim, maravilhosa profecia…”, de 1970.
Acontecia o ano de 1946. Eu era solteiro e jovem, de carne e de espírito. Acompanhando meu saudoso amigo e colega de banco Cícero de Almeida, estava sorvendo uma “gelada” em um não recomendável “cabaret” de Curitiba, frequentado por damos e damas igualmente também não mui respeitáveis, salvo raras e honrosas exceções que, felizmente, se as há, quando, como sempre fiz, peguei um pedaço de papel e minha caneta e comecei a fazer esboços rapidíssimos dos dançarinos ao som de melancólicos tangos.
Surpreso, meu amigo, também desenhista, exclamou: — Ernesto, é incrível tua facilidade para desenhar. Se estudares seriamente desenho, em dois anos serás um grande desenhista!
Um novo “estalo de Vieira”, que certamente aconteceram muitos desde que nosso famoso padre faleceu, explodiu minha então jovem cuca. Teria eu, finalmente, descoberto minha verdadeira vocação???
É desse ano a primeira paisagem do artista: uma vista do centro de Curitiba, do quinto andar de um hotel, feita a nanquim.
1951
O início da década de 1950 marcou o começo da produção artística de Meyer Filho, com seu primeiro desenho sobre o boi-de-mamão – que viraria um dos principais temas de sua obra. Ele costumava seguir os grupos nas apresentações realizadas nas imediações de sua casa, no Centro de Florianópolis, para captar os traços das figuras do folguedo popular.
Com pesquisas mais consistentes, veio a consciência de que, sim, ele era um artista, ao mesmo tempo em que se dava conta de que precisava intensificar os estudos, e passou a comprar livros de anatomia humana e animal e a treinar incessantemente técnicas de composição, de perspectiva, e de luz e sombra.
A gente aprende uma porção de regras para depois, pela deformação artística, mandá-las praticamente às favas, mas o fato é que realmente estudei, disse Meyer ao crítico Theon Spanudis.
1952
Meyer Filho publicou suas três primeiras charges de cunho político em jornais de Florianópolis, passando a se utilizar dos veículos de comunicação de massa para circular seu trabalho.
As charges políticas foram publicadas de forma contínua até 1956. No entanto, sua veia política continuou a ser expressa em charges e croniquetas publicadas de forma mais esporádica, em grande parte no jornal O Estado, de Florianópolis.
1954
Continuando a produzir charges, Meyer Filho criou a série “Brasil 1954” – que trazia críticas sociais contundentes e “uma especial preocupação artística no manejo do preto e branco”, segundo o artista – e foi publicada de forma recorrente na seção “Charge da Semana”, na Folha Popular e em outros jornais da capital catarinense. Os jornais locais também reproduziram os sete desenhos que compõem a primeira série sobre o boi-de-mamão.
Mais tarde, em 1987, em uma das charges da série “Brasil 1954”, que mostrava, em um quadro, pessoas miseráveis carregando ferramentas e, no seguinte, políticos engravatados falando sobre aumentar subsídios e fazer acordos, o artista fez o seguinte comentário a caneta: Brasil 1987 estará diferente?
Meyer conta que a partir de 1954 começou a enriquecer a biblioteca com belos livros de arte e história natural. Principalmente de arte. E que, além da boemia, atravessava madrugadas estudando história da arte desde os primeiros desenhos e pinturas pré-históricas das cavernas da Europa, aos mais recentes “ismos” da arte contemporânea.
1955
A descoberta da cor! Nesse ano, o artista passou a experimentar as cores em seus desenhos. Ainda de forma tímida, segundo ele, foram primeiramente sete ou oito desenhos, coloridos com lápis de cera, representando figurinhas de barro da cerâmica popular catarinense.
As figuras tradicionais da cerâmica catarinense também serviram de inspiração para o artista ilustrar a capa do número 24 da Revista Sul. Meyer Filho foi colaborador – assinando desenhos de duas capas e outras ilustrações – dessa importante publicação do Círculo de Arte Moderna (CAM), que marcou o modernismo em Santa Catarina com conteúdo sobre literatura e artes.
Sob o comando de Aníbal Nunes Pires, Eglê Malheiros, Salim Miguel e Ody Fraga e Silva, a Revista Sul reuniu nomes fundamentais para a cultura catarinense, como Armando Carreirão, Silveira de Souza, Hugo Mund Jr., além do próprio Meyer.
1957
O ano da 1ª Exposição de Pinturas e Desenhos de Motivos Catarinenses, realizada em parceria com Hassis, no Instituto Brasil Estados Unidos (IBEU), em Florianópolis, foi, de acordo com Meyer Filho, um ano muito fértil. O sucesso dessa exposição impulsionou a criação do Grupo de Artistas Plásticos de Florianópolis (GAPF), que seria formalizado no ano seguinte.
São desse ano as primeiras de suas figuras mais populares, os galos e as paisagens coloridas com lápis de cor e nanquim. Segundo o artista, “Fundo de Quintais nº1” e “Fundo de Quintais nº2” foram os seus desenhos mais trabalhosos, que exigiram muitos meses de trabalho: As árvores foram desenhadas, folhinha por folhinha. Milhares delas.
Os primeiros desenhos “fantásticos”, “Árvore seca com passarinhos em tarde sombria”, “Idílio fantástico” e “Paisagem sideral” também datam de 1957.
1958
Nove artistas da capital se reuniram para formar o Grupo de Artistas Plásticos de Florianópolis (GAPF). No Diário Oficial de 29 de agosto de 1958, constam, como fundadores, Hugo Mund Júnior, Ernesto Meyer Filho (diretor provisório), Pedro Paulo Vecchietti (secretário provisório), Hiedy Assis Corrêa, Rodrigo de Haro, Thales Brognoli, Tércio da Gama (tesoureiro provisório), Aldo Nunes e Dimas Rosa.
Nesse ano foi realizado o 1º Salão do Grupo de Artistas Plásticos de Florianópolis, evento que Meyer Filho descreveu como com muitas brigas. Para a disputa de três insignificantes prêmios de Cr$5.000,00 cada, foi o diabo.
Outra participação em coletiva importante para o artista foi no 1º Salão Pan-Americano de Artes, no Instituto de Belas Artes do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, qQuando começou a ser visto além das fronteiras de Santa Catarina.
1958 foi também o ano da primeira exposição individual de Meyer Filho, com 17 desenhos, realizada no Museu de Arte de Florianópolis – MAMF (hoje, Museu de Arte de Santa Catarina – MASC). Nesse ano, Meyer Filho participou, ainda, do Concurso Ilustrações de Poesias de Cruz e Sousa, realizado no MASC. O artista ficou em segundo lugar e doou o prêmio à família do poeta.
1959
No 2º Salão do Grupo de Artistas Plásticos de Florianópolis, no MASC, Meyer dividiu a primeira colocação com Hugo Mund Jr. Na ocasião, Meyer Filho, que participou com 15 desenhos, sofreu algumas críticas, entre elas, uma que classificou como “pitoresca”, um “poeta” e cronista social da terra, que classificou meus trabalhos como uma “rechonchuda criação de galinhas”…..
1960
Podemos dizer ser este desenhista uma ilha dentro de outra ilha, escreveu a crítica de arte Rosa Pessoa, no artigo “Meyer Filho, um desenhista de Florianópolis”, no Shopping News de 17/04/1960.
O artigo se referia à primeira exposição individual fora do estado de um artista catarinense residente em Santa Catarina, na Galeria Penguin, no Rio de Janeiro. O catálogo dessa exposição, produzido por Hugo Mund Júnior, contou com textos dos críticos Flávio de Aquino e Rosa Pessoa.
Também a respeito da individual de Meyer Filho na Galeria Penguin, Maura de Senna Pereira escreveu, na Gazeta de Notícias, do Rio de Janeiro: Desenhos que nos trazem um mundo surpreendente, com rubros sóis, constantes flores, galos com olhos humanos, firmes cavalos com asas, num dos quais eu chegaria logo ao País de Rosamor.
“País de Rosamor” foi o título dado a um dos principais livros da poeta lançado dois anos depois da exposição de Meyer Filho na Penguin. Nos poemas que compõem essa obra, Maura deseja, prevê e propõe um novo mundo, mais justo, menos desigual e com mais harmonia entre seres humanos e natureza. Nesse sentido, é possível pensar que a primeira mulher a se tornar membro da Academia Catarinense de Letras via em Meyer Filho um companheiro de utopia.
Em 1960, Meyer Filho foi convidado para expor no Museu de Arte de São Paulo (MASP). A instituição, porém, não cumpriu o compromisso.
1961
Logo em janeiro, Meyer Filho publicou um imponente galo na capa do segundo número da Revista Litoral, criada pelos irmãos Paschoal e Nicolau Apóstolo Pítsica, sob a orientação de Othon Gama Lobo D’Eça.
No mesmo ano, outra publicação ilustrada por Meyer Filho foi lançada: o livro Uma menina de Itajaí, da mãe do artista, trazia desenhos feitos por ele em 1959.
Em sua segunda exposição individual no MASC, Meyer Filho apresentou cem desenhos e recebeu críticas importantes de Flávio de Aquino, João Evangelista de Andrade Filho, Sylvia de Leon Chalreo, Rosa Pessoa e Maura de Senna Pereira. No entanto, o artista lamentou que por motivos que desconheço, não agradou a quase totalidade dos intelectuais de Florianópolis, nem aos responsáveis pela cultura barriga-verde….
Em setembro, 38 desenhos do artista compuseram a individual do artista no Museu de Arte de Belo Horizonte.
1963
Em 5 de setembro de 1963, uma nota na Folha de S.Paulo anunciou o fim prematuro da exposição de Meyer Filho na Casa do Artista Plástico, na capital paulista. Motivo: Nada ficou na parede e na pasta. Ernesto vendeu os 100 desenhos e aquarelas que trouxe […]. Vários artistas também adquiriram obras de Meyer Filho, que regressa empolgado.
Além do sucesso nas vendas de obras, a primeira exposição de Meyer em São Paulo rendeu muitos elogios da crítica especializada. Ainda na Folha, José Geraldo Vieira escreveu: Meyer Filho demonstra, além de perícia manual, de gosto autêntico e de sensibilidade aguda, algo de maior importância, que é a personalidade marcada, sui generis, que se distancia do desenho figurativo dos demais artistas em voga (assim como o “swing” e o “bop” se distanciam do “blues” e do “ragtime”).
Nesse ano, Meyer Filho se tornou “Embaixador plenipotenciário de Marte no planeta Terra”, após uma viagem ao planeta vermelho.
Eram três horas da madrugada quando bateram na porta do meu quarto de hotel. Atendi, olhei, era um cara assim meio diferente. Perguntei “quem és tu, jovem?” Ele respondeu: “eu sou cidadão do planeta Marte”. E quero entrevistá-lo e levá-lo para o meu querido planeta vermelho, porque tu, espiritualmente, és um cidadão marciano”. Eu fui.
1964
O sucesso alcançado no ano anterior fez com que Meyer Filho fosse convidado para fazer uma segunda exposição individual na Casa do Artista Plástico. Na ocasião, Meyer conheceu Tomie Ohtake, que inaugurava uma mostra na Galeria São Luís, também em São Paulo. O jornal O Estado de S.Paulo registrou o encontro dos dois artistas na edição do dia seguinte.
Meyer e Tomie se encontraram outras vezes. O catarinense foi um dos responsáveis pela exposição de Ohtake em Florianópolis em 1987.
A segunda individual na Casa do Artista Plástico firmou Meyer Filho no cenário da arte brasileira. O crítico Theon Spanudis registrou o crescimento na obra do artista na Revista Habitat.
Esta sua última exposição em São Paulo, principalmente a série de galos e pássaros fantásticos marca um decisivo passo para a frente, um verdadeiro pulo qualitativo. O seu desenho até então era essencialmente narrativo. […] Mas de repente seu desenho vira plástico e essencialmente plástico. Este é o pulo qualitativo. […] Não resta dúvida, com esta última exposição em São Paulo, Meyer Filho virou um artista autêntico, originalíssimo, de qualidades plásticas extraordinárias
1969
A exposição individual no Salão de Arte da Rádio Diário da Manhã, em Florianópolis, surpreendeu até os mais íntimos da obra de Meyer Filho.
No convite dessa exposição, estão textos de importantes críticos que legitimaram a arte de Meyer Filho ao longo dos anos, como Sylvia de Leon Chalreo, Rosa Pessoa, Theon Spanudis, João Evangelista de Andrade Filho e Flávio de Aquino. Na ocasião, Péricles Prade classificou Meyer como “um artista sem rótulos”.
1970
Nesse ano, além da exposição individual no Salão da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMAB), em Curitiba, Meyer Filho participou de diversas coletivas, como a Pré-Bienal de São Paulo, e o Mini-mercado das Artes, de onde foram roubados cinco quadros do artista.
Mesclando deboche e indignação, Meyer redigiu um “COMUNICADO À IMPRENSA FALADA, ESCRITA E TELEVISIONADA DO BRASIL”, que foi lido em rádios de Florianópolis, informando sobre o furto e oferecendo uma “recompensa” aos ladrões.
Embora já tenha apresentado queixa à POLÍCIA, rendendo uma sincera homenagem aos meus jovens apreciadores, que, por falta de recursos financeiros para adquirir um quadro meu de maior valor, AFANARAM os citados quadros, me comprometo, sinceramente, a presentear cada um deles com um bonito e rápido desenho meu, até com dedicatória, tão logo me devolvam os quadros roubados, que eu reputo, no mínimo, em CR$20.000,00 (Vinte mil cruzeiros).
Os quadros nunca foram devolvidos.
1971
Embora tenha realizado uma exposição individual no MASC e participado de coletivas em Florianópolis – Semana de Arte do Instituto Estadual de Educação (IEE), 12 Artistas de Florianópolis, Arte Catarinense – e em Blumenau – 2ª Coletiva de Arte Barriga-Verde –, 1971 ficou marcado na vida de Meyer como o ano do “renascimento”, da “liberdade”. Cultivo o 20 de julho, dia do meu nascimento, costumava dizer.
20 de julho de 1971 foi a data em que o bancário Meyer Filho se aposentou do Banco do Brasil – sem nenhuma falta ao serviço, nenhuma úlcera no estômago e nenhuma promoção por merecimento!!!! – e Meyer Filho pôde se tornar artista em tempo integral.
Dez anos mais tarde, na exposição de desenhos eróticos, quando comemorou uma década de aposentadoria, ao Jornal de Santa Catarina, Meyer falou: Trabalhei 30 anos no BB e vou comemorar minha aposentadoria. […] Todas as promoções do Banco que eu tinha direito ou por antiguidade, eu consegui. Agora, se ninguém me promoveu por merecimento, isto não é problema meu, né? Eu queria era ser pintor.
1973
Esse ano foi marcado pela ótima repercussão da individual do artista na Galeria Marte, na cidade do Rio de Janeiro.
No catálogo da exposição, um entusiasmado Flávio de Aquino assinou o texto “O real e o irreal em Meyer Filho”, em que afirmava: nesta exposição, Meyer Filho, inteiramente entregue à sua tarefa de artista, realiza com brilhantismo nossas previsões e a de outros críticos brasileiros, que nele também viram um dos melhores desenhistas brasileiros do real que se fundamenta no irreal. Pois, para Meyer Filho, o real e o irreal confundem-se em seus sonhos.
Já Meyer explicou (em “Os galos fantásticos de Meyer Fº”, texto publicado no jornal O Estado, em 15 de agosto de 1973) seu trabalho como uma mistura de muitas coisas. Eu fiz uma fusão do primitivismo, surrealismo, modernismo e tantos outros ismos para um trabalho próprio. À minha maneira, que depende unicamente da minha imaginação. Só gosto de coisas bonitas e quando o real é feio, eu o faço bonito. Raramente uma paisagem pintada por mim é o que é na realidade. Justamente porque eu não sou fotógrafo.
1974
Meyer Filho expôs individualmente no Studio A2, coordenado pelo jornalista Beto Stodieck e pelo produtor Luís Paulo Peixoto. A galeria Studio A2 contribuiu para a valorização e a visibilidade da arte catarinense, propondo, inclusive, linhas de crédito bancário para a compra de obras de arte. A vernissage da individual de Meyer Filho reuniu grande público para prestigiar a “noite do galo”, uma noite de “muito cacarejar”, como destacaria Beto Stodieck em sua prestigiada coluna no jornal O Estado em 06 de junho de 1974, com destaque para a seguinte frase: “Quem cacareja sempre alcança”.
Meyer e Beto tinham uma relação de admiração mútua e de amizade. O artista costumava enviar desenhos e charges para serem publicados na coluna do jornalista.
1976
Em 1976, “Seu Galo” voou para além das fronteiras do Brasil e para duas exposições individuais na Argentina, Galeria del Mar, em Mar del Plata, e na Galeria Lagard, em Buenos Aires; além de uma coletiva no Hotel Sheraton, também na província de Buenos Aires.
O trabalho de Meyer Filho foi bem recebido no país vizinho, como se pode ver no artigo de Luis Aubele no jornal La Opinión.
Los dibujos evocan una imaginería popular, un bestiario equivalente al de los primeros exploradores, pero con una magia más simple: unicornios-machos, cabríos devoradores de flores-repollos, ángeles con máscara de diablo, saltibanquis, piedras melancólicas o alimañas inimaginables. El artista los cubre con pieles de amuletos: ojos, corazones, soles, peces; lineales rigorosos. Dicen que dibujar es una forma de pensar. En este caso, Meyer Filho, más que un pintor näif, sería un filósofo folklórico que, como sus antecesores, trata de ordenar el caos.
No ano seguinte, o artista foi convidado para participar da coletiva 4 Pintores Ingênuos, também na Galeria Lagard.
ainda em 1976
Meyer Filho buscou apoio da Universidade Federal de Santa Catarina para uma exposição que realizaria em São Paulo. Com a negativa da UFSC ao seu pedido, o artista entrou no hall da reitoria gritando “o reitor é um cafeicultor! o reitor é um cafeicultor!”.
A insatisfação de Meyer com a falta de política de apoio à arte (e principalmente à dele) da UFSC vinha de longa data, e ele resolveu tornar pública essa desavença, espalhando por Florianópolis – na década de 1980 – outdoors que traziam o desenho de uma figura híbrida, meio centauro com pernas humanas e cabeça de galo, que dizia: Por que será que a UFSC vem, desde 1960, ignorando o talento e arte de Meyer Filho?
1978
A coletiva NOVE Grupo de Artistas Plásticos de Florianópolis – 1958/1978 – 20 anos depois, que marcou as duas décadas do grupo que transformou a arte catarinense foi o ponto alto entre as exposições que Meyer Filho participou em 1978. Estavam nessa exposição, além de Meyer Filho, os artistas Aldo Nunes, Dimas Rosa, Hassis, Hugo Mund Jr., Rodrigo de Haro, Tércio da Gama, Thales Brognoli e Vecchietti.
No catálogo, Lindolf Bell, sobre a importância do GAPF para a arte de Santa Catarina, escreveu:
Toda comunidade tem suas pulsações, tendências, ritmos, linguagens. Isto não é sinônimo de regionalismo nem de limitação. Significa a infinita capacidade do homem, de multiplicar sua riqueza espiritual, cultural e humana.
Santa Catarina redescobriu isto, coletivamente, com os artistas plásticos de Florianópolis […].
Isto pode ser um significado real. Um dado concreto. Uma tomada das nossas ambiguidades e a instauração de um projeto que, interminavelmente, se projeta no presente. E se projetará no futuro.
Nessa ocasião, respondendo a críticas de pessoas que o chamavam de “pintor de galos” (algumas pessoas chegaram a jogar milho no chão do Museu), Meyer Filho levou galos de verdade para a exposição.
1979
Para comemorar seus 60 anos, Meyer Filho preparou uma exposição individual no MASC. Nesse mesmo ano, participou de coletivas em diversas cidades catarinenses.
Experiente e consciente, Meyer refletia sobre seu papel político e social de artista e, quando perguntado sobre a função política da arte, na entrevista “Os bastidores da arte são uma verdadeira máfia”, publicada no jornal O Estado, em 14/10/1979, respondeu:
Se o artista está de acordo com o poder, é mais fácil para ele vencer, e a maioria está nessa, é claro. Eu acho que a arte deve estar acima da política, porque tudo é política: Se eu faço um bom trabalho estou sintomaticamente elevando o nível cultural de quem olha, e isto é um ato político. Quando eu pinto o Boi-de-Mamão estou pintando uma obra de arte.
Na Rússia o bom artista é aquele que pinta de acordo com o sistema. Na China é aquele que pinta uma fábrica, por exemplo. Tem gente que acha que o artista deve, obrigatoriamente, pintar o povo. Ora, pinta o povo quem está a fim, eu também já pintei o povo.
Na exposição Meyer Filho 60 anos, o artista surpreendeu mais uma vez, levando um casal de galinha inglesa, de plumagem carijó. Foi a 2ª vez que um galo cantou em minhas exposições, escreveu Meyer em uma anotação abaixo da foto sobre o evento publicada no jornal O Estado.
1980
Ser reconhecido por seus pares no Brasil e fora do país era um dos maiores desejos do artista Meyer Filho e se, ao longo de sua carreira, não foram poucas suas reclamações por acreditar que não era suficientemente valorizado, também não foram poucos os elogios.
Em 1980, o jornal O Mossoroense (do município de Mossoró, Rio Grande do Norte) classificou Meyer Filho como o único sobrevivente do dilúvio universal. A matéria, assinada por Franklin Jorge, continuava tecendo elogios: Esse homem é um “brujo”, isto é, um artista. Ou, se preferis, um mágico cujo nome foi adorado pelos feiticeiros caldeus.
ainda em 1980
Ser reconhecido por seus pares no Brasil e fora do país era um dos maiores desejos do artista Meyer Filho e se, ao longo de sua carreira, não foram poucas suas reclamações por acreditar que não era suficientemente valorizado, também não foram poucos os elogios.
Em 1980, o jornal O Mossoroense (do município de Mossoró, Rio Grande do Norte) classificou Meyer Filho como o único sobrevivente do dilúvio universal. A matéria, assinada por Franklin Jorge, continuava tecendo elogios: Esse homem é um “brujo”, isto é, um artista. Ou, se preferis, um mágico cujo nome foi adorado pelos feiticeiros caldeus.
1981
Esse foi um ano em que Meyer Filho surpreendeu o público, especialmente, em duas ocasiões: quando levou o Boi-de-Mamão do Grupo Folclórico do Morro da Tico-Tico à exposição no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC) e quando lançou o álbum de pinturas e desenhos eróticos no Studio de Artes.
A exposição e o álbum de pinturas e desenhos eróticos de Meyer Filho foram muito bem recebidos pela crítica e pelo público. Sobre isso, o crítico Georges Racz escreveu: Trata-se na realidade de uma obra lúdica, carnaval de Baco descontraído. Irreverente e escancarado, trata-se da abordagem, dignamente inserida na obra do artista, dando-lhe continuidade, elevando-as na universalidade.
No mesmo ano, foi lançada uma publicação do Boi-de-Mamão do Grupo Folclórico do Morro da Tico-Tico com as letras das músicas folclóricas e ilustrações de Meyer Filho. Na apresentação do livro, em um manuscrito, depois de explicar que o boi-de-mamão era a denominação florianopolitana do bumba-meu-boi, Meyer afirmou que o BUMBA-MEU-BOI (com todas as suas denominações, naturalmente) é o MAIS IMPORTANTE auto popular brasileiro, quer pela legitimidade temática e lírica, quer pela genuidade nacional.
1983
Em 1983 o artista Meyer Filho passou a dividir espaço com o comunicador. Falante e despojado, ele foi convidado a apresentar um quadro – o Papo de Galo – no Jornal Barriga Verde.
Quando perguntado sobre a sua “finalidade na televisão”, em uma entrevista ao jornal O Estado, Meyer disse: Sou invenção do Paulo Ubiratan. Ele foi quem criou esta coisa que está aqui. Televisão não estava no meu programa. Dormi no estúdio da minha casa e acordei no estúdio da TV Barriga Verde. Esses caras inventam coisas. E eu estou aqui. E não é que estou gostando? Agora tenho a certeza que a minha participação na tevê aos 64 anos de idade serve como uma lição aos jovens que acham que as pessoas após os 36 anos estão…
Beto Stodieck comentou a nova ocupação do amigo artista em sua coluna no Jornal de Santa Catarina e narrou um fato pitoresco: Meyer Filho cacarejava ao vivo na televisão: […] o pintor Meyer Filho que jamais havia sonhado, um dia, cacarejar diante do vídeo – cacareja um minuto e meio por programa – um sarro indescritível – só mesmo vendo e rindo.
1984
Em 1984, Meyer Filho listou mais seis exposições coletivas em seu currículo, entre elas a Arte de Santa Catarina, na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), São Paulo; e a que fez em parceria com seus filhos, Paulo Meyer e Sandra Meyer, na Max Stolz Galerie, em Florianópolis. Três anos mais tarde, as obras de Meyer e filhos estiveram juntas outra vez, no Espaço de Arte, também na capital catarinense.
Novamente, o artista decidiu dar uma pausa na produção. Dessa vez, “tirou férias”, como contou ao jornal O Estado, de 23/08, no artigo “Arte, as ‘férias’ de Meyer Filho”.
Pedi para o relógio da minha casa parar. Sou um pintor que logo após a exposição no Banco do Brasil, em dezembro, olhou para o espelho mágico da sua casa e disse: preciso de cinco meses de férias! Desde então só estou fazendo desenhos rápidos e plantando couve e árvores frutíferas. (…) Nem só de galos vive o pintor Meyer Filho; ele vive também de hortaliças e frutas.
1987
A passarela da Paulo Fontes foi onde Meyer Filho disse ter vivido uma das maiores emoções de sua vida, momento em que foi homenageado pela escola de samba Protegidos da Princesa, a convite de Murilo Pereira, diretor artístico da escola. “Casos e ocasos raros desta ilha tropical” foi o tema escolhido do ano, e para compor o enredo, a Protegidos trouxe à frente o carro Galo Sideral, criação de Meyer Filho, que era um dos casos raros da cidade, e que desfilou como destaque pela primeira vez, nos seus 67 anos de idade, de gravata borboleta vermelha e preta, camisa branca e fraque preto, as cores da Protegidos: Está sendo um dos maiores prazeres da minha vida, declarava enquanto sambava.
1991
Meyer Filho faleceu em junho de 1991, deixando uma vasta obra como legado para a arte brasileira.